Após pressão do empresariado, que alega ter grandes dificuldades para se adaptar às exigências, a Receita Federal resolveu adiar novamente os prazos para implantação do eSocial. As empresas optantes do lucro real, com receita anual acima de R$ 78 milhões, agora serão obrigadas a iniciar a transmissão das informações a partir de outubro, substituindo as guias de recolhimento a partir de janeiro de 2015. Os demais contribuintes passarão a ter que acessar o eSocial apenas em janeiro de 2015. O sistema já teve como data inicial janeiro deste ano. Posteriormente, foi prorrogado para abril e depois para junho, de forma não oficial pela Receita Federal.
O eSocial obrigará as empresas a oferecer a órgãos do governo federal informações detalhadas, e praticamente em tempo real, sobre folha de salários, impostos, previdência e informações relacionadas aos trabalhadores, que vão desde a admissão até a exposição deles a agentes nocivos. Parte do Sistema Público de Escrituração Digital (Sped), que já conta com áreas fiscal e contábil, o eSocial - nome dado pela Receita Federal para a Escrituração Fiscal Digital Social - tem um manual de mais de 200 páginas e um conjunto de mais de 20 tabelas, a maioria com centenas de itens de preenchimento.
Além da preocupação em como consolidar essas informações que no dia a dia das companhias ainda são dispersas em diversos departamentos, o receio das empresas é que as informações do eSocial resultem em elevação do volume de autuações, tanto fiscais como trabalhistas.
Os novos prazos, segundo nota enviada ao Valor pela Receita Federal, foram autorizados porque a equipe de gestão do eSocial - composta pelos representantes da Previdência Social, do Trabalho e Emprego, Conselho Curador do FGTS e Receita Federal - recebeu pedidos de prorrogação do cronograma para permitir uma melhor adaptação das empresas. E assim, avaliou que "é possível alterar o período inicial sem prejudicar as diversas integrações do sistema, como guias de recolhimento, substituição das obrigações atuais, unificação dos procedimentos".
A Receita Federal, porém, afirma na nota não considerar essa mudança um adiamento "mas sim o resultado de um debate com a sociedade para finalizar a elaboração e publicar o ato normativo que vai instituir o eSocial no âmbito de todos os órgãos participantes".
O presidente da Associação Comercial do Estado de São Paulo, Rogério Amato, afirma ter participado dessa negociação junto com representantes de outras entidades. "Todas pediram esse adiamento porque entramos em um processo terrível, de excessiva burocratização, que pode trazer distorções para o futuro", diz. Para Amato, o adiamento foi solicitado para que exista um maior diálogo sobre as exigências do sistema. "O eSocial promove uma ingerência na vida das pessoas e das empresas que não existe em lugar nenhum do mundo."
Segundo Angela Rachid, gerente de produtos da divisão brasileira da ADP, empresa especializada em soluções de RH e folha de pagamento, que participa do projeto-piloto da Receita Federal, o adiamento também se deu por ordem operacional. Isso porque ainda não foi finalizado pelo Comitê Gestor do eSocial a chamada Qualificação Cadastral dos Trabalhadores, que será o primeiro passo para alimentar o sistema.
Na qualificação, os dados cadastrais fornecidos pelos trabalhadores - nome, data de nascimento, CPF e PIS - serão cruzados com os dados da Previdência Social e, se houver qualquer erro de cadastro, a empresa terá que corrigi-lo. Segundo Ângela, a previsão era de que esse sistema entrasse em funcionamento em março, mas por enquanto não foi disponibilizado. "Após essa qualificação, as empresas terão seis meses para se adaptar, chegando em outubro", diz
A possibilidade de adiamento foi comemorada por advogados de empresas. Para Fabio Medeiros, sócio do Machado Associados, "as pequenas e médias empresas estão bastante despreparadas para entender todos os impactos do eSocial". Segundo ele, a prorrogação do prazo seria também uma boa oportunidade para que o comitê de implantação do eSocial ofereça uma atenção especial às empresas menores, que não participaram do projeto-piloto. "O comitê poderia elaborar, por exemplo, um manual mais simplificado", diz.
Apesar de ter visto com bons olhos a prorrogação, o advogado afirma que a implantação não deveria ser prolongada por muito mais tempo. "As grandes companhias já fizeram seu investimento e um novo adiamento poderia gerar insegurança e um descrédito sobre sua implantação", diz.
Para Marcos Cezar Najjarian Batista, do Advocacia Najjarian Batista, seria um bom momento para a Receita aprimorar seu sistema e, com um controle maior, promover uma diminuição da carga fiscal previdenciária. "Como será um instrumento eficaz, isso deve diminuir o risco de inadimplência", afirma.