Um grupo de cinco estudantes da Escola Estadual Mario D’Elia, em Franca, desenvolveu um protótipo de teste rápido para bebidas adulteradas. O projeto, apelidado de “acorda, Cinderela”, foi desenvolvido por estudantes da 2ª série do Ensino Médio ao longo de três meses com uso de alcaloides e outros compostos químicos.
A proposta veio da estudante Kemily Patrícia Lira, que desde o início do ano se sensibilizou com as notícias de vítimas de abuso na região envolvendo o “boa noite, Cinderela”. Ela vive com constante hipoglicemia, e foi durante o uso do glicosímetro que a ideia nasceu. “Pensei: ‘e se eu pudesse descobrir se a minha bebida está adulterada tal como quando eu meço a minha glicemia?’ Nós já queríamos fazer algo para a feira de ciências da escola, então a ideia foi imediatamente aceita”, explica a estudante, que se uniu aos colegas Matheus Carboni, Natália Ferreira, Ana Livia Barbosa e Daniel de Andrade para desenvolvimento do projeto.
Para esta tarefa, os estudantes contaram com a orientação dos professores Milena Aímola Falqueto e Irineu Zulato, ambos mestres com amplo conhecimento em ciências biológicas e neurociência, respectivamente. “Inicialmente tivemos que apresentar as substâncias presentes no ‘boa noite, Cinderela’, tal como cetamina e GHB, para que os estudantes compreendessem como eles funcionam no nosso corpo. Em um segundo momento, buscamos reproduzir essa dinâmica com alcaloides, que são compostos químicos orgânicos”, explica Milena.
“Os alcaloides são de origem vegetal, por isso estão presentes na maioria das plantas. Além de conter uma boa quantidade de nitrogênio, eles também são responsáveis por proteger as plantas de predadores e dar um sabor amargo à maioria delas”, explica o estudante Daniel de Andrade. Ele, que sempre se interessou pela área de artes, tomou gosto pela ciência e hoje fica animado com o potencial do projeto: “os alcaloides atuam no sistema nervoso central, então faz todo sentido usá-los como exemplo de algo maior, como medicamentos mais fortes”, acrescenta.
Os estudantes criaram um kit de reação colorimétrica com fita de absorção e reagente químico que atualmente já identifica a presença de alcaloides em bebidas. A proposta dos estudantes é aprimorar a técnica de forma que o mesmo kit também identifique benzodiazepínicos, não-benzodiazepínicos, além de inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRS).
Para atestar a viabilidade do projeto, de junho a agosto, os estudantes, juntamente com os professores Milena e Irineu, realizaram 30 testes aplicando 2ml de alcaloides em 200ml de seis tipos de bebidas diferentes, independentemente serem alcóolicas. Até mesmo a colorimetria precisou ser avaliada por meio de três tipos de papéis de absorção, além das interferências externas. “Para um projeto como esse, é necessário o máximo de rigor laboratorial e o máximo de atenção.”, explica a professora Milena.
“O método escolhido por nós é um aspecto importante, pois outras propostas já fizeram o mesmo por meio de canudos ou mesmo copos”, descreve a estudante Kemily sobre o kit desenvolvido pela turma. “A nossa proposta se assemelha mais com um teste rápido, pois impede o contato da pessoa com o objeto que atesta o que tem a mais na bebida”, conclui.
Atualmente, o grupo se concentra na finalização de um artigo científico com os resultados da fase de testes, enquanto dá entrada na solicitação de compra de patente da iniciativa. A ideia do grupo é que a proposta se popularize e ajude a população, sobretudo mais jovem, em épocas como a do carnaval.
A diretora da Escola Estadual Mario D’Elia, Rosemeire de Oliveira Mora Domenegheti, parabenizou a iniciativa dos estudantes e o trabalho dos professores. Para ela, “o sucesso da pesquisa é fruto da ‘sementinha’ de cada um dos participantes envolvidos, que dedicaram tempo, leitura, criatividade e senso de pertencimento”. “É emocionante ver jovens que se importam com os seus e fazem a diferença. Nossa escola não poderia estar mais orgulhosa”, finaliza.