PMs da Rota são acusados de matar homem e forjar provas em Guarujá

Autor: Redação Pop Mundi

Fonte:

20/12/2023

Um sargento e um soldado da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), batalhão especial da Polícia Militar de São Paulo, são os primeiros réus pelas mortes da Operação Escudo.

Promotores do Ministério Público estadual acusam os dois PMs de matar um homem de 49 anos que não oferecia nenhum risco, e forjar provas na cena do crime.

A morte ocorreu às 7h47 de 30 de julho no Morro do Macaco, em Guarujá, no litoral paulista. A vítima era Rogério Andrade de Jesus, que morreu dentro de casa, com um tiro de fuzil no tórax.

Jesus foi o sétimo homem morto por policiais na Operação Escudo, que estava em seu terceiro dia. Os promotores afirmam que não havia nenhum indício de flagrante, ou confronto, e que os policiais não tomaram qualquer medida para anunciar sua chegada.

Imagens mostram que os dois policiais —o sargento Eduardo de Freitas Araújo e o soldado Augusto Vinícius Santos de Oliveira— bloquearam as próprias câmeras corporais, com os braços e as mãos. A denúncia diz que um colete a prova de balas e uma pistola, com numeração raspada, estavam com os PMs e foram plantados na cena do crime.

Segundo o processo, os réus ainda não constituíram defesa. A reportagem não conseguiu contato com eles.

Questionada, a SSP (Secretaria de Segurança Pública) afirmou que está analisando a denúncia, e que a Promotoria "exerce seu papel legal de apresentar uma denúncia-crime mesmo que baseada em indícios, que podem ou não ser confirmados ao final do processo legal".

A pasta disse que vai afastar os policiais do patrulhamento nas ruas, acatando uma decisão da Justiça. Afirmou ainda que o Ministério Público já se posicionou de maneira contrária "a outras denúncias contra policiais que participaram da mesma Operação Escudo".

A Rota, na qual estão lotados os dois réus, é o batalhão ao qual pertencia o soldado Patrick Bastos Reis, 30, que foi morto no dia 27 de julho por criminosos em uma favela em Guarujá.

A morte dele deu início à megaoperação da PM, com efetivo de mais de 600 policiais. Após mais de cinco semanas, a operação deixou um total de 28 mortos.

Moradores e familiares das vítimas denunciaram, logo no início da operação, casos em que policiais teriam invadido casas, torturado e ameaçado a comunidade.

Sobre esses relatos, o governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) tem afirmado, que todos os casos são investigados minuciosamente pela Polícia Civil e em inquérito da Policia Militar, que os laudos não apontaram tortura e que todas as provas estão sendo compartilhadas com os órgãos de controle.

"Durante toda a incursão, a equipe não visualizou qualquer ato suspeito que ensejasse perseguição, confronto ou outra diligência", afirmam os promotores.

Dois policiais que faziam parte da mesma equipe dos réus naquele dia não foram indiciados. Eles ficaram na retaguarda e não entraram na casa da vítima, como mostram as imagens. Um deles entrou só depois da morte, também com a câmera bloqueada, mas os procuradores afirmam que isso não é suficiente para afirmar que ele sabia que haveria um crime.

"O fato de compor equipe policial, por si só, não serve como elemento indiciário de comprovação de participação em tudo o que alguém do grupo faz", diz a denúncia. Os promotores pedem que ele seja investigado na Justiça Militar.

DENÚNCIA DESCREVE PASSO-A-PASSO DA AÇÃO

O patrulhamento no Morro dos Macacos naquele dia começou às 7h26, segundo o relato da denúncia. Quatro PMs participaram da incursão —um sargento, um cabo e dois soldados—, todos com suas câmeras corporais gravando.

Poucos minutos depois, os policiais abordam três homens e conferem seus documentos de identidade. Eles não são revistados e a equipe prossegue na comunidade.

A equipe conversa com outro homem, pouco depois, e perguntam quem seria o morador de uma casa vizinha. Ele responde que não o conhece. "Novamente, em razão da ausência de qualquer ato suspeito, os policiais militares não abordam ou perseguem qualquer indivíduo na região", registra a denúncia.

Em seguida, dois PMs ficam para trás enquanto o sargento e o soldado seguem em direção à casa de Rogério Andrade de Jesus. O sargento Araújo, segundo a descrição das imagens, ficou cerca de um minuto em frente à casa, tentando ver o que havia ali dentro.

Araújo então ficou ao lado da porta, e o soldado Oliveira atrás dele. "Sem a ocorrência de qualquer fato prévio que fundamentasse suspeita de possível flagrante delito e sem tentar chamar pelo morador, tal como tinha acabado de fazer na casa vizinha, abriu a porta da casa da vítima", diz a denúncia.

Com a porta aberta, o sargento apontou o fuzil para dentro da casa. Passaram-se 28 segundos até que um único disparo atingisse a vítima.

Os promotores dizem que, logo após o disparo, o sargento se posicionou de maneira que a câmera não filmasse o corpo do homem alvejado. A imagem, porém, mostra "a inexistência da pistola atribuída" a Rogério Jesus no local, segundo o Ministério Público. Depois, o soldado Oliveira "simula que apreendeu a pistola supostamente usada pelo ofendido, permanecendo com a câmera obstruída", segundo a denúncia.

A Promotoria também diz que os PMs levaram um colete balístico antes da ação. Esse colete também foi filmado pelas câmeras, que captam um volume estranho embaixo do colete que o sargento usava. Quando eles deixam a casa, a lateral do colete balístico de Araújo está aberta.

"Restou apurado que, previamente aos fatos, o colete balístico foi levado ao Morro do Macaco, de forma oculta, com o objetivo de ser 'plantado' na cena de um eventual confronto policial", diz a denúncia.

O documento diz, no entanto, que não foi possível identificar onde estariam as drogas. O boletim de ocorrência do caso registra que a equipe da Rota encontrou um tijolo de maconha na casa.

Na delegacia, a equipe foi entrevistada em grupo. O sargento Araújo afirmou que gritou que o homem havia apontado uma arma em sua direção e que gritou para ele a largasse. O cabo e os dois soldados disseram ter ouvido o aviso.



Fonte: Folhapress
Fotos: Reprodução