"Cuidado para não ser laçada!". Foi com essa recomendação que viajei a Barretos, no último final de semana, para cobrir a Festa do Peão. Alheia ao universo country e, em princípio, pouco informada sobre a festa, não entendi a razão de tal aviso. Conversando com algumas pessoas e pesquisando a respeito, fui apresentada ao famoso e questionável ritual de conquista, praticado há anos no evento realizado no interior de São Paulo. A tradicional festa encerra sua edição 2013 neste domingo (25).
A primeira reação foi pensar mil formas de revidar, em caso de uma abordagem deste tipo. Obviamente, eu não me envolveria em confusão. Não sou do tipo que briga e, antes de qualquer coisa, estaria ali a trabalho. Mas é preciso reconhecer que a faceta profissional convive com outras tantas dentro de mim. Além de jornalista, sou feminista, capoeirista e, de uma certa forma, ativista. Alguma delas poderia reagir mal à situação. Não só por considerar a prática de péssimo gosto, mas também por imaginar a câmera fotográfica emprestada pela empresa caindo das minhas mãos, em velocidade proporcional à queda do nível de paciência. Isso foi antes de chegar.
Já no Parque do Peão, conversei rapidamente com um dos assessores do evento para explanar minhas pautas e esquematizar as entrevistas mais desejadas. Entre elas, citei a intenção de escrever sobre as meninas laçadas. "Isso é mito, não acontece mais", explicou logo o assessor. Perguntei se a prática havia sido proibida, ele respondeu que não, uma vez que não era algo oficial. Mas informou que a organização adotou medidas para coibir esse tipo de incidente. Antes, não era preciso ter ingresso para frequentar certas áreas do parque, e alguns locais eram usados para fazer "esquenta" e paquerar. Hoje o acesso a todo o local ficou restrito aos pagantes.
Circulei pelo parque todo, em uma maratona frenética para tirar o máximo proveito das poucas horas que passaria na festa. De fato, nem sinal de laços. Se alguém foi capturado, aconteceu longe do meu campo de visão. Já que não me deparei com nenhuma caça às mulheres, resolvi conversar com algumas meninas sobre o assunto. Entre opiniões diversas sobre o ritual, o alívio por ele ter sido extinto era unânime.
Em Barretos pela primeira vez, um grupo de oito meninas afirmou, em sua maioria, que foi ao evento com medo dos laços. Uma delas discordou: "eu queria ser laçada". "Ela está bêbada", minimizou a outra. Duas amigas de São Paulo disseram que já sabiam que a brincadeira havia sido "proibida", mas admitiram que não se arriscaram a passar pela Avenida 43, fora do parque, onde foi registrada grande parte dos casos. Sem saber das medidas tomadas pela organização, outras duas, vindas de Bauru (SP), garantiram que não foram com medo, mas ouviram dizer que as abordagens com laço não aconteciam apenas em uma região isolada, e sim em vários locais do parque. Uma moça de Matão (SP) afirmou que, apesar de considerar "chato" ser alvo dos laços, já havia sido vítima e não ficou tão brava. "Ele era bonito", justificou. Já uma dupla de Uberlândia (MG) disse que sabia que não acontecia mais e que apoia o fim da prática: "não é brincadeira". Perto de encerrar as perguntas, finalmente, encontrei conterrâneas tão desinformadas quanto eu. As paulistanas sequer sabiam da existência da tradição, mas renderam uma foto muito bonita.
Em novo contato, a assessoria da Festa do Peão afirmou que a prática já não acontece há anos e que não foram tomadas medidas específicas com o objetivo de evitá-la. O que mudou foi o aumento do efetivo policial, para coibir brigas e badernas, e o perfil do evento que, segundo a organização, está mais voltado para a família.
Fonte: Terra