As motivações que têm levado milhares de pessoas a protestar nas ruas de diversas cidades devem servir para incentivar os brasileiros a lutar e cobrar reformas estruturais na política do país. Na avaliação do professor da pós-graduação em política social da Universidade de Brasília (UnB) Vicente Faleiros, se é verdade que o "gigante acordou", como bradam os manifestantes em redes sociais e com cartazes durante os protestos, é preciso que ele não se cale até que o "modo de fazer política no Brasil" passe por mudanças radicais e sustentáveis.
"O momento da revolta é o de se repensar não apenas em aspectos pontuais, mas na maneira de fazer política. Com essas manifestações, colocou-se em questão não apenas o valor da passagem, mas a maneira como está organizada a representatividade no país. É preciso repensar e modificar a relação da política com o povo e com o mercado".
Doutor em sociologia, Faleiros defende o fim do que classifica de "fulanização da política". "No Brasil temos o costume de dizer que o ´fulano´ é bom, acreditando que uma personalidade será o salvador da pátria. Enquanto isso, persistem os currais eleitorais, a prática do clientelismo e do apadrinhamento. Por isso, nossa luta tem que ser pela reorganização da política e das relações de poder", acrescentou.
Ao ressaltar que o Brasil vive uma crise de representatividade, na medida em que a classe política, independentemente de partidos ou de níveis de poder, vem perdendo a credibilidade da população, ele defendeu uma reforma que garanta uma democracia mais participativa do que representativa, capaz de aproximar os agentes públicos das demandas da população, em uma relação orgânica e que atenda aos interesses como um todo e não fragmentados, setorializados.
Entre as medidas que o especialista defende em uma reforma política estão a ampliação da transparência dos gastos públicos, com informações diretas e fáceis sobre os destinos dos recursos e a quem está beneficiando; o financiamento público de campanhas; e a apropriação mais efetiva das ferramentas de participação social no processo eleitoral, como a Lei da Ficha Limpa.
Para o professor, os protestos ocorridos em São Paulo, no Rio de Janeiro, em Brasília, em Belo Horizonte, entre outros, são consequência de um processo construído ao longo dos anos de insatisfação em relação a diversos aspectos associados à revolta com a repressão.
"Estamos fortalecendo uma sociedade de consumo, mas o mercado não pode substituir o Estado. Como as pessoas querem medidas efetivas para melhoria das condições do cotidiano, como as relacionadas à saúde, educação e transporte, foram às ruas para protestar e a resposta dada foi a repressão, o que demonstra não apenas um despreparo da polícia, mas da política brasileira, já que a polícia é uma das esferas desse modo de fazer política", enfatizou.
Fonte: Agência Brasil