A revelação de que o presidente francês, François Hollande, teria um caso com uma atriz pode ter um impacto político negativo e fragilizar ainda mais a sua já desgastada imagem, segundo especialistas.
Isso ocorreria não por razões de ordem moral, mas devido ao fato de que o caso extraconjugal pode sugerir à opinião pública que o presidente não estaria totalmente concentrado nos problemas do país, segundo o cientista político Stéphane Montclaire, da Universidade Sorbonne.
Para analistas, população teme que novo romance faça Hollande perder o foco dos problemas da França / Foto: ReproduçãoApenas um quarto dos franceses afirma que Hollande é capaz de enfrentar os problemas da França. Ele é o presidente com o menor índice de popularidade (entre 22% e 26%, segundo diferentes pesquisas) desde o general Charles de Gaulle, no final dos anos 1950.
O suposto caso com a atriz Julie Gayet também deve ofuscar, segundo especialistas, a ação política do presidente neste início de ano. Isso ocorre no momento em que ele se prepara para detalhar, possivelmente na terça-feira, mudanças na linha econômica - com reduções de encargos para as empresas que criarem empregos.
A medida vem sendo interpretada como uma reviravolta na doutrina socialista.
"Essa revelação da amante não ocorre em um bom momento para Hollande. Se ele fosse extremamente popular e a opinião pública achasse que o país vai bem, o presidente não sofreria desgaste com isso", afirmou Montclaire. Segundo ele, haverá um "impacto político indireto".
"Os franceses acham que a situação do país é grave, com desemprego alto, e poderão pensar que o presidente, em vez de se concentrar nos problemas, passa seu tempo com a amante", disse o cientista político.
Pela primeira vez na história, a infidelidade de um presidente francês foi revelada de forma tão explícita pela imprensa do país.
Hollande viveu por três décadas com a política francesa Ségolène Royal, com quem teve quatro filhos - todos adultos atualmente. Ele se separou após as eleições presidenciais de 2007, ficando com a atual parceira Valérie Trierweiler.
A revista de celebridades Closer, que já sofreu inúmeros processos na Justiça por divulgar a vida íntima de famosos, publicou nesta sexta-feira uma reportagem de capa, com sete páginas, intitulada "O amor secreto do presidente", que revela sua suposta relação com a atriz Julie Gayet.
A matéria mostra fotos de um homem - que poderia ser Hollande - chegando ou saindo na garupa de uma moto de um apartamento a poucos metros do palácio do Eliseu.
O homem usa o tempo todo um capacete. Mas as imagens mostram o segurança pessoal de Hollande inspecionando o local poucos minutos antes da chegada da moto ou aguardando na saída e até levando croissants de manhã cedo.
O apartamento pertence a um casal de amigos da atriz. Ela utiliza o local e sempre chega antes e sai depois do homem que usa o capacete.
Gayet chegou a gravar um vídeo para a campanha presidencial de Hollande. Rumores sobre o suposto caso já circulavam há meses na internet, mas até então jornais e revistas não haviam abordado o assunto de maneira tão direta e em detalhes.
Hollande afirmou em comunicado "deplorar profundamente o não respeito à vida privada ao qual ele tem direito como qualquer cidadão" e indicou que poderá processar a revista Closer. Mas ele não desmentiu as informações da revista.
Políticos, até mesmo da oposição, defenderam o direito à vida privada do presidente. Mas alguns, nas redes sociais, comentaram ironicamente a "felicidade" do presidente em meio aos anúncios recentes de demissões no país e outros problemas.
Analistas afirmam que a vida política francesa é repleta de casos de infidelidade: dos monarcas, como Luís 14 aos presidentes das últimas décadas, sobretudo Valéry Giscard d'Estaing, François Mitterrand e Jacques Chirac, vários deles tiveram relações extraconjugais que chegaram a ser publicada nos jornais, sob forma de rumores.
Um presidente francês, Felix Faure, da chamada 3? República, morreu na cama com a amante, em 1899.
Mas desta vez, no caso de Hollande, a própria imprensa francesa diz que uma barreira foi derrubada em relação à privacidade.
Fotos como a da filha ilegítima de Mitterrand, publicada pela revista Paris Match em 1994, no final de seu mandato, ou do passeio de Sarkozy com Carla Bruni na Eurodisney, em 2007, foram publicadas com o consentimento dos presidentes.
Sarkozy divulgou amplamente sua vida pessoal em revistas de celebridades, o que chocou boa parte da população. Seu comportamento foi criticado por não corresponder à sua função de chefe de Estado.
"Na época de D'Estaing, Mitterrrand e Chirac, prevalecia um certo silêncio na imprensa sobre essas questões. O interesse pela política se focaliza cada vez mais na vida privada dos políticos, o que contribuiu para enfraquecer esse dever de reserva", disse Jean Garrigues, especialista em história política do instituto de estudos políticos Sciences Po, em Paris.
"As mentalidades evoluíram. A aceleração do ritmo da informação e a necessidade de alimentar em permanência a atualidade levaram a uma maior sensibilização em relação à vida privada dos políticos, afirmou Garrigues.
Fonte: BBC Brasil